Darwin e a escravidão

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Darwin e a escravidão

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Livro diz que ideias abolicionistas levaram britânico a propor a teoria da evolução
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Como o bicentenário do nascimento de Darwin é nesta quinta-feira dia 12 de fevereiro (2009), nada mais adequado do que voltarmos a escrever sobre a sua obra e seu legado.

Acaba de sair aqui nos EUA um livro oferecendo um ponto de vista bem diferente sobre a motivação principal que levou Darwin a desenvolver a teoria da evolução.

Em “A Missão Sagrada de Darwin” (“Darwin’s Secret Cause”), Adrian Desmond e James Moore argumentam que foi a repugnância moral de Darwin à escravidão que o motivou a levar adiante suas ideias.

E foi quando Darwin visitou o Brasil durante a famosa viagem em torno do mundo com o navio HMS Beagle que ele travou contato direto com os horrores da escravidão.
Certo dia, quando passava de canoa por um mangue, Darwin ouviu um grito terrível. O doloroso episódio ficou gravado na sua memória.

“Até hoje”, escreveu o naturalista em seu jornal mais tarde, “quando ouço um grito à distância, revivo com enorme intensidade o que senti quando, ao passar perto de uma casa em Pernambuco, ouvi gemidos terríveis, certamente vindos de um escravo sendo torturado e, tal qual uma criança, não pude fazer nada.”

Em seus livros “A Origem das Espécies” e “A Origem do Homem e a Seleção Natural”, Darwin argumenta por uma origem comum da vida. Sendo assim, existe uma irmandade entre todos os homens, o que torna a escravidão um crime absurdo. O interessante do argumento é que, segundo os autores, foram as ideias abolicionistas de Darwin que o levaram à teoria da evolução e não o contrário.

Seu avô, o famoso médico e poeta Erasmus Darwin, era um notório abolicionista, muito amigo do industrial Josiah Wedgwood, cujas porcelanas são conhecidas até hoje. Wedgwood usou seus fornos para criar um medalhão com a imagem de um escravo acorrentado e a legenda: “Não sou também um Homem e seu Irmão?” O medalhão era um objeto cobiçado por todos que eram da mesma opinião.

As famílias Darwin e Wedgwood foram unidas por uma série de matrimônios. O próprio Charles casou-se com Emma Wedgwood, sua prima de primeiro grau. (Interessante que o pai da evolução tivesse feito isso. Tiveram dez filhos e dois morreram na infância. A cada vez que um dos filhos ficava doente, Darwin se preocupava com os laços excessivamente estreitos de sua família. Nesse caso, ter dez filhos deve ter sido provavelmente uma espécie de experimento.)

A abolição era certamente tema constante nas conversas da família, um trato quase hereditário. Foi nesse ambiente ideológico que Darwin cresceu e criou os filhos. Certamente, Darwin viu escravos ainda na Inglaterra. Ao estudar (teologia) em Cambridge, aprendeu que certos membros da igreja anglicana eram radicalmente contra a escravidão. Sabia que não estava sozinho e que o movimento abolicionista apenas cresceria com o tempo. Mas queria mais do que argumentos apenas morais. Queria argumentos científicos.

Ao propor a evolução das espécies, Darwin não nos excluiu. Esse foi o maior motivo para a recepção nem sempre positiva de suas ideias. “O quê? Nós, descendentes de orangotangos? Primos dos negros da África, dos chineses e dos aborígenes da Austrália? Ridículo!”

Para Darwin, não havia dúvidas. A vida bifurcava a partir de um tronco único. O fato de sabermos hoje que nossa constituição genética é extremamente próxima da dos chimpanzés (entre 95% e 98,7%) só fortalece o seu argumento. Se a ciência de Darwin não foi criada para justificar a unidade da vida, ela certamente o fez.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”.
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0802200904.htm
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Publicado em:
http://sinapseslinks.blogspot.com/
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