Seu Olhar

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Um olhar bom e profundo

“…se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz;”
Jesus (Mateus 6,22)

Cristian Macedo
cristianmacedo@potencial.net

1. O que é um olhar bom e profundo?

Neste texto utilizarei o termo “olhar” entendendo-o como o que Allan Kardec chamou de “ponto de vista”, em O Evangelho Segundo o Espiritismo.

Esse olhar vai além do sentido da visão que o corpo possui. É a capacidade de percebermos a realidade. É a maneira que a alma toma conhecimento e trava contato com o mundo interior e o da sua volta.

A realidade e suas dimensões são o objeto do olhar da Alma. É o meio. Tanto a dimensão espiritual, quanto a material (e suas infinitas gradações) da realidade podem ser percebidas pela criatura através desse olhar, na proporção dos seus conhecimentos e maturidade.

O ser que vê, assim o faz através de uma espécie de lente, que podemos chamar de estado geral da Alma. Este é estruturado através da educação do ser, que se dá no contato que possui com o meio. As pessoas terão grande influência nesse estado geral, principalmente a figura dos pais que, na reencarnação, serão os primeiros a fornecerem elementos para a sua educação. Este estado geral, por ser impermanente, vai transformando o olhar da alma que, no mais das vezes, vai modificando sua forma de ver a vida ao longo do tempo.

Quando uma educação moral e espiritualizada é oferecida pelo meio e acolhida pela alma, o ser imortal passa a ter um olhar mais complexo da realidade. Ao ver as coisas, apreende a integralidade. Vê o todo sem desmerecer as partes, entendendo os diversos ângulos do objeto observado.

Quando o meio favorece uma visão mais profunda, a lente vai se tomando menos opaca e o ponto de vista cada vez mais se fixa na alma imortal que se percebe como tal, e não se demora num olhar materialista, próprio da ignorância.

Assim, um olhar bom e profundo seria a capacidade de perceber a realidade em sua amplitude, compreendendo a si mesmo, aos outros e a dimensão material e espiritual da realidade.

O olhar bom e profundo é próprio de uma mente alerta.

Não caindo no senso comum que acredita que aquele que tem olhos bons “vê o bem em tudo”, quem possui um olhar bom e profundo vê com plena atenção, é vigilante e não compactua com a ingenuidade.

2. Como ter um olhar bom e profundo?

Ao refletirmos sobre o processo do olhar, compreendemos que a educação oferecida ao Espírito reencarnado é essencial. O meio deve lhe favorecer o crescimento, dando condições para que seu olhar seja o mais lúcido possível.

No entanto, em um mundo difícil como o que habitamos, existem grandes dificuldades no processo de amadurecimento do olhar. O meio é adverso, pois a ignorância ainda prevalece. O estado íntimo das almas é marcado pelos condicionamentos nocivos, principalmente nas áreas da violência e da sexualidade perturbada. A “lente” está cada vez mais opaca.

Sendo a ignorância um obstáculo à conquista de um olhar bom e profundo, cabe refletirmos sobre algumas de suas dimensões:

a) ignorância em relação a si mesmo.
A Alma que não conhece a si mesmo, normalmente se encontra perdida no mundo; dá mais valor as coisas da matéria e corre em busca de ilusões. Não percebendo a própria realidade, mesmo que pertença a movimentos espiritualistas, vive os dias na Terra sem se preocupar com questões mais profundas, não encontrando seu propósito, amargando uma existência melancólica e sem grandes realizações do espírito.

b) a ignorância em relação às dimensões da realidade.
O ser imortal vibra na dimensão espiritual da vida. Ao reencarnar, se depara com uma realidade mais difícil, onde a matéria densa inibe sua livre manifestação. Seus sentidos são limitados e, grudado ao solo, necessita enfrentar as lutas cotidianas para burilar-se a fim de merecer outras moradas mais ditosas do Universo, ou, de acordo com seus propósitos, permanecer no planeta a fim de contribuir com sua transformação. No entanto ainda a grande massa ignora essas verdades, e, mesmo que diga crer numa realidade que transcenda a matéria, vive no mundo como se do mundo fosse, gozando ou se entregando ao ócio, sem cogitar em viver de forma a oferecer algo de nobre à Vida.

c) a ignorância em relação aos outros.
Com a atual “coisificação” do ser humano, o outro passou a ser um objeto de uso, ou um ser estranho a ser eliminado. A dignidade é esquecida, de acordo com o valor amoedado que se lhe dê em troca. A pornografia já se tomou profissão “normal”, e ser celebridade (ou casar com uma) é sonho de muitas pessoas na Terra. A falta de compreensão entre os seres humanos vem gerando cada vez mais violência, e as famílias vêm se desintegrando de forma assustadora. A incompreensão torna o olhar nublado, fazendo com que enquadramentos preconceituosos e a xenofobia estejam em alta.

O ser ignorante possui um olhar terra-a-terra, e poucas condições possui de alçar maiores vôos intelectuais.

3. Quais os malefícios de um olhar limitado?

O olhar limitado, nublado pela ignorância, não vê o mundo com clareza. Percebendo a vida pelo olhar manchado pelos vícios, vê o mal em tudo. Entrega-se ao ciúme, à inveja, ao orgulho, à raiva. Passa recibo às provocações, ao despeito que fere gratuitamente, se atormentando por nonadas e, a pouco e pouco, transferindo para o corpo todas as tormentas acolhidas pela mente desorientada. Fruto da lei de ação e reação, a criatura mergulha no mal que pensa, faz e se nutre, gerando para si mesmo um estado íntimo perturbado, um presente de angústias e um futuro de desequilíbrios.

Não são poucas as doenças comprovadamente oriundas de um estado mental perturbado.

4. Quais os benefícios de um olhar bom e profundo?

Quando conquistamos um olhar bom e profundo, percebemos o todo e passamos a separar o “joio do trigo”, alimentando nossa intimidade do que é positivo, percebendo o que é negativo, mas não recolhendo lixo para nossa alma.

Tendo “olhos de ver”, nossa caminhada na Terra se torna menos sofrida, percebemos que estamos no mundo de passagem e não podemos nos inquietar em demasia com os bens que se desagregam.

O olhar bom e profundo se dá quando mudamos nosso ponto de vista, da vida material temporária, passamos a ver a realidade segundo a ótica da alma que nunca perece.

Nessa percepção, surge a noção de impermanência, pois o ser dá-se conta de que “as vicissitudes e tribulações dessa vida não passam de incidentes que ele suporta com paciência, por sabê-Ias de curta duração”.

Além disso vemos brotar o entendimento de interdependência, pois o ponto de vista ampliado faz perceber que “essa vida não passa de um elo no harmonioso e magnífico conjunto da obra do Criador. Mostra a solidariedade que conjuga todas as existências de um mesmo ser, todos os seres de um mesmo mundo e os seres de todos os mundos. “

Quando nos dermos conta das ilusões em que nos demoramos, nossa mente conquistará o equilíbrio e nosso corpo receberá as emanações mentais positivas, o que lhe possibilitará a saúde integral.

A mente sã transfere ao corpo sadio as vibrações positivas que são frutos de um olhar bom e profundo.

Quando a ilusão vai se apagando, o amor vai tendo lugar. O sol interior se faz vivo, iluminando a própria criatura, os seres e a natureza, pois quem vê com os olhos do amor ilumina a tudo.

A mente
tem luz. O corpo tem luz. Vendo em profundidade a alma demonstrará estar alerta, desperta para a realidade em suas dimensões, sabendo por que está na Terra e quais as possibilidades de fazer o bem que lhe estiver ao alcance para a construção de um mundo melhor.
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O autor é professor de história e consultor na área de RH; atua no Estado do Rio Grande do Sul.
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A riqueza dos olhos deve ser direcionada para o bem.
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REVISTA INTERNACIONAL DE ESPIRITISMO ANO LXXXI- Nº02- MATÃO-MARÇO 2006
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Colaboração:
Edna Sbrissa – São Paulo-SP
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Publicado em: SinapsesLinks
http://sinapseslinks.blogspot.com/
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2 comentários sobre “Seu Olhar

  1. Um item nesse texto me chamou atenção.. “Quando conseguimos conquistar um olhar bom e profundo, percebemos o todo e passamos a separar o joio do trigo, alimentando nossa intimidade do que é positivo, percebendo o que é negativo, mas, não recolhendo o lixo para a nossa alma.
    Profundo demais!!!!!! Pois, agora estou aliviada, porque eu não consigo por mais que eu queira concordar com pessoas, mesmo que essas pessoas sejam íntimas isto é fazem parte da família , com irregularidades praticadas que fogem ao senso comum de qualquer pessoa honesta. Eu, não conseguia me perdoar por esta pessoa estar sempre provocando um nó na minha garganta por julgamentos que eu tinha contra essas atitudes,e,ao pensar na mesma vinha sempre aquele julgamento de não aceitação. Eu, como espírita que sou achava que eu não devia proceder dessa maneira e sim perdoar e fechar os olhos. Mas, a minha têmpera não concordava e eu sempre me alterava. Pois, agora, não tenho mais que me condenar, eu estava certa. Embora na minha opinião o alheamento do fato está de acordo com o não recolhimento do lixo para a nossa alma. Só Deus tem o poder de direcionar o fato de acordo com a sua lei inalterável. Obrigada Tereza

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