Melhores de 2008

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Melhores de 2008

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Publicação lista as descobertas importantes do ano passado
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Recebi recentemente um exemplar da publicação americana “Science News” com uma lista das 20 mais importantes (de acordo com eles) descobertas científicas de 2008. Resolvi fazer uma seleção das que são mais relevantes aos temas de que tratamos aqui na coluna.
Gostaria de incluir outras, mas o espaço é curto. Aqui vão:

1. Planetas extrassolares fotografados: dois grupos de astrônomos apresentaram as primeiras fotografias de planetas girando em torno de outras estrelas. Um deles, usando o Telescópio Espacial Hubble, identificou um planeta em torno da estrela Formalhaut, a 25 anos-luz de distância da Terra. O outro, usando dois enormes telescópios no topo da montanha Mauna Kea, no Havaí, fotografou nada menos do que três planetas girando em torno da estrela HR 8799, a 130 anos-luz da Terra. Ou seja, pela primeira vez na história, astrônomos fotografaram um outro sistema solar.
A caça a planetas extrassolares começou há pouco mais de dez anos. E já são mais de 300 deles. Isso leva os cientistas a uma conclusão muito importante: se a maioria das estrelas tem seus planetas, o número de planetas por galáxia é gigantesco. Só na nossa, que tem em torno de 300 bilhões de estrelas, pode haver mais do que um trilhão de planetas. E isso sem contar as luas! Se estamos interessados em vida extraterrestre, esses números indicam que não faltam possíveis casas onde a vida pode ter surgido.

2. O gigantesco acelerador de partículas LHC é ligado -e desligado: localizado na fronteira entre a Suíça e a França, o acelerador passou o em seu primeiro teste quando foi ligado, no dia 10 de setembro. Prótons viajaram pelo percurso de 27 quilômetros em túneis cem metros abaixo do subsolo com velocidades próximas à da luz. O objetivo do acelerador é colidir prótons com outros prótons, transformando sua energia de movimento em matéria segundo a famosa fórmula E = mc2. (Quanto mais rápidos os prótons, mais energia têm e mais matéria pode ser gerada em suas colisões).
Uma das perguntas a que os cientistas querem responder com o LHC é de onde vem a massa de partículas como o elétron e os quarks, componentes dos prótons. Infelizmente, um vazamento de hélio líquido que refrigera os ímãs supercondutores no túnel levou ao fechamento do acelerador até julho deste ano. Com o filme “Anjos e Demônios” saindo agora (que se passa, em parte, no laboratório onde fica o LHC), a popularidade do experimento é enorme. Como são, também, as expectativas de resultados.

3. Macaco controla braço mecânico com seu cérebro: eletrodos foram implantados nos cérebro de macacos na região que controla o movimento muscular. Usando o seu pensamento, ou a intenção de mover o braço, os macacos conseguiram aperfeiçoar seu controle do braço mecânico a ponto de alimentar-se com ele. Um computador traduziu a atividade elétrica dos neurônios dos macacos em sinais para o braço. A promessa de próteses é enorme. Infelizmente, no momento, os eletrodos implantados no cérebro de macacos ou mesmo de pessoas acabam atacados pelo sistema imunológico como invasores.

4. Nova evidência indica que vida na Terra começou bem cedo: cristais de zircão datando de 4,2 bilhões de anos atrás indicam possível atividade biológica. Até então, os primeiros sinais de vida na Terra datavam de, no máximo, 3,8 bilhões de anos atrás. Se comprovada, essa descoberta indicará que a vida aqui surgiu bem antes do que o esperado e sob condições bem dramáticas: muito vulcanismo e quedas de asteroides. Se isso ocorreu aqui, a possibilidade de ter ocorrido em outros planetas aumenta bastante.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0305200903.htm
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Tem alguém lá fora?

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Tem alguém lá fora?

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Se não procurarmos, jamais encontraremos vida extraterrestre
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Na semana passada, participei de uma conferência no Space Telescope Institute, a casa do Telescópio Espacial Hubble. Apropriadamente, na segunda-feira o ônibus espacial Atlantis voou em direção ao telescópio-satélite para instalar novas câmeras numa última viagem de revisão e reparos. O venerável instrumento, um dos mais famosos da história da tecnologia, será aposentado em 2014, após 24 anos de serviço.

A missão da Atlantis e seus sete astronautas é das mais arriscadas até hoje, devido à quantidade de lixo espacial na mesma órbita do Hubble, a uma altitude aproximada de 500 quilômetros. Técnicos da Nasa estimam a probabilidade de colisão com um micrometeoro (pedaços de satélites abandonados ou dos dois que colidiram em fevereiro) em 1 em 229 -relativamente alta. As diretrizes de segurança da Nasa estipulam uma probabilidade mínima de 1 em 200.

O trânsito espacial em torno da Terra está ficando bem congestionado. Espero que o Hubble consiga sobreviver mais cinco anos.

A conferência tratava de um tópico um tanto popular, a busca por vida no Universo. Vou tratar de assuntos diversos em outros domingos, mas hoje queria começar por uma das palestras finais, apresentada por Jill Tarter, uma das cientistas líder do projeto Seti, a busca por inteligência extraterrestre. Quem viu o filme “Contato”, inspirado no romance homônimo de Carl Sagan, deve lembrar da heroína do filme, interpretada pela atriz Jodie Foster, que tentava “ouvir” transmissões de rádio feitas por civilizações tecnologicamente avançadas vivendo em planetas distantes. Do mesmo modo que nossos rádios captam ondas emitidas por antenas transmissoras, se apontarmos uma antena bem sensível na direção de um planeta poderíamos, em princípio, ouvir as transmissões feitas de lá. Claro, eles também podem estar na escuta…

Na prática, essa busca é extremamente complexa. As chances de sucesso são quase nulas. A transmissão tem de ser na nossa direção, com uma potência suficiente para que nossas antenas possam captá-la, e numa frequência em que estejamos sintonizados. Como sabemos dos nossos rádios, para ouvirmos algo temos de sintonizar numa estação, por exemplo, 98,5 MHz, o que significa uma onda de rádio com 98,5 milhões de ciclos por segundo. Qual seria a estação dos ETs? Existe essencialmente um número infinito de frequências. Escolher as mais “prováveis” envolve um jogo de adivinhação muito subjetivo.

São já 50 anos de Seti e até agora nada. Isso não surpreende a dra. Tarter.
“Estamos apenas engatinhando em nossa busca. Nossa civilização é muito jovem, temos poucos recursos. Por outro lado, se não procurarmos, jamais encontraremos”. Verdade. Mesmo que a chance de sucesso seja muito pequena, imagine se, um dia, os cientistas do Seti captam um sinal que é claramente produzido por outra civilização. Alguns acham que tal descoberta seria a mais importante da história, que tudo mudaria: não só não seríamos o único planeta com vida, mas teríamos companhia tecnológica.

Muito provavelmente, dada a tenra idade da nossa tecnologia, os ETs estariam muito na nossa frente. Quem sabe nos ajudariam a resolver nossos problemas de fome, doenças, efeito estufa… do jeito que as coisas andam, acho melhor nós mesmos cuidarmos dos nossos assuntos. Enquanto isso, quem quiser ajudar pode doar o tempo em que seu computador está parado para que cientistas do Seti possam destrinchar os bilhões de sinais que recebem. Basta ir ao site setiathome .ssl.berkeley.edu. Quem sabe o sinal não chegará ao seu computador?
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1705200903.htm
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Definindo Vida

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Definindo vida

Metabolismo e reprodução são propriedades essenciais

A vida é uma dessas coisas mais fáceis de identificar do que de definir.

É incrível que, passados tantos séculos desde que começamos a pensar cientificamente sobre o mundo, ainda não tenhamos uma definição universalmente aceita sobre o que é a vida.

Por exemplo, sabemos que uma pedra não está viva. E por quê? Uma pedra não come, não bebe, não se reproduz. Comer e beber significa que atribuímos aos seres vivos a necessidade de se alimentar e de transformar alimentos em energia. Ou seja, seres vivos exibem alguma forma de metabolismo. A reprodução, a capacidade de fazer cópias de si mesmo, é outra característica fundamental dos seres vivos. A espécie que não se reproduz desaparece. Portanto, metabolismo e reprodução são as duas propriedades mais importantes da vida. Qualquer definição do que seja vida tem que incluí-las. Mas e o fogo? Se alimenta também, consumindo oxigênio e a matéria que entra em combustão. E se reproduz, espalhando-se por onde pode. Porém, todos concordam que o fogo não é considerado um ser vivo.
Estrelas, também, podem confundir.

Por meio da fusão nuclear, consomem o hidrogênio em seu interior, transformando-o no elemento hélio, um processo que libera enormes quantidades de radiação. Numa espécie de autofagia, as estrelas se alimentam da própria matéria. De certa forma, estrelas também se reproduzem: quando uma “morre”, explode com enorme violência, espalhando sua matéria pelo espaço. Se essa matéria colidir com uma nuvem de hidrogênio, causará instabilidades que fazem com que a nuvem entre em colapso e se transforme, caso tenha matéria suficiente, numa nova estrela. Dentre outras coisas, a diferença entre o fogo ou uma estrela e uma ameba ou uma mariposa está na composição química: seres vivos são formados por compostos orgânicos, moléculas complexas que incluem proteínas e ácidos nucléicos, o RNA e DNA usados na reprodução.

Vemos na insistência de uma definição da vida uma limitação da linguagem. Não é que não saibamos como definir a vida; talvez a vida seja indefinível, ao menos de forma precisa e universal. Talvez tenhamos que nos contentar com uma definição operacional: a vida é um sistema de reações químicas autossustentáveis capazes de extrair energia do ambiente e de se replicar. Mesmo que essa definição não mencione compostos orgânicos, é difícil incluir o fogo e as estrelas nela. Em discussões sobre o que é a vida, sempre se fala nos vírus e nos príons como casos limite. Os vírus só se reproduzem em contato com uma célula viva, e os príons nem material genético têm. Por não terem autonomia, ambos são considerados “replicadores” em vez de seres vivos. Essas distinções e definições não são apenas questões de interesse acadêmico. Com a exploração de outros planetas e luas, é cada vez mais importante compreendermos as várias facetas da vida. Mesmo que limitados no momento pelo que estudamos aqui na Terra, nossas definições precisam ser gerais o suficiente para englobar formas de vida inesperadas. É difícil prever em detalhe o que nos espera em outros mundos. Talvez nada, ao menos a julgar pelo que encontramos até agora.

Contudo, como dizia Carl Sagan, a ausência de evidência não é evidência de ausência. (Aliás, essa definição funciona também para fadas, duendes, Deus…)

Devemos manter a cabeça aberta e nossas definições amplas, para englobar o desconhecido. Seja o que for, se estiver vivo precisará de energia e terá de se reproduzir. Com relação a isso, não temos do que duvidar.

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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1204200904.htm
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Publicado em: SinapsesLinks
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Astroteologia

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Astroteologia
Por: Marcelo Gleiser

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É alta a chance de que “eles” sejam mais inteligentes
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Aparentemente, foi o filósofo grego Epicuro que sugeriu, já em torno de 270 a.C., que existem inúmeros mundos espalhados pelo cosmo, alguns como o nosso e outros completamente diferentes, muitos deles com criaturas e plantas.

Desde então, ideias sobre a pluralidade dos mundos têm ocupado uma fração significativa do debate entre ciência e religião. Em um exemplo dramático, o monge Giordano Bruno foi queimado vivo pela Inquisição Romana em 1600 por pregar, dentre outras coisas, que cada estrela é um Sol e que cada Sol tem os seus planetas.

Religiões mais conservadoras negam a possibilidade de vida extraterrestre, especialmente se for inteligente. No caso do cristianismo, Deus é o criador e a criação é descrita na Bíblia, e não vemos qualquer menção de outros mundos e gentes. Pelo contrário, os homens são as criaturas escolhidas e, portanto, privilegiadas. Todos os animais e plantas terrestres estão aqui para nos servir. Ser inteligente é uma dádiva que nos põe no topo da pirâmide da vida.

O que ocorreria se travássemos contato com outra civilização inteligente? Deixando de lado as inúmeras dificuldades de um contato dessa natureza- da raridade da vida aos desafios tecnológicos de viagens interestelares- tudo depende do nível de inteligência dos membros dessa civilização.

Se são eles que vêm até aqui, não há dúvida de que são muito mais desenvolvidos do que nós. Não necessariamente mais inteligentes, mas com mais tempo para desenvolver suas tecnologias. Afinal, estamos ainda na infância da era tecnológica: a primeira locomotiva a vapor foi inventada a menos de 200 anos (em 1814).

Tal qual a reação dos nativos das Américas quando viram as armas de fogo dos europeus, o que são capazes de fazer nos pareceria mágica.

Claro, ao abrirmos a possibilidade de que vida extraterrestre inteligente exista, a probabilidade de que sejam mais inteligentes do que nós é alta. De qualquer forma, mais inteligentes ou mais avançados tecnologicamente, nossa reação ao travar contato com tais seres seria um misto de adoração e terror. Se fossem muito mais avançados do que nós, a ponto de haverem desenvolvido tecnologias que os liberassem de seus corpos, esses seres teriam uma existência apenas espiritual. À essa altura, seria difícil distingui-los de deuses.

Por mais de 40 anos, cientistas vasculham os céus com seus rádio telescópios tentando ouvir sinais de civilizações inteligentes. Quem viu “Contato” com Jody Foster ou leu o livro de Carl Sagan que inspirou o filme lembra das várias cenas em que ela tenta decifrar os sinais de rádio que recebia.

Infelizmente, até agora nada foi encontrado. Muitos cientistas acham essa busca uma imensa perda de tempo e de dinheiro. As chances de que algo significativo venha a ser encontrado são extremamente remotas.

Em quais frequências os ETs estariam enviando os seus sinais? E como decifrá-los? Por outro lado, os que defendem a busca afirmam que um resultado positivo mudaria profundamente a nossa civilização. A confirmação da existência de outra forma de vida inteligente no universo provocaria uma revolução. Alguns até afirmam que seria a maior notícia já anunciada de todos os tempos. Eu concordo.

Não estaríamos mais sós. Se os ETs fossem mais avançados e pacíficos, poderiam nos ajudar a lidar com nossos problemas sociais, como a fome, o racismo e os confrontos religiosos. Talvez nos ajudassem a resolver desafios científicos. Nesse caso, quão diferentes seriam dos deuses que tantos acreditam existir? Não é à toa que inúmeras seitas modernas dirigem suas preces às estrelas e não aos altares.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”.
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe0103200903.htm
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Darwin e a escravidão

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Darwin e a escravidão

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Livro diz que ideias abolicionistas levaram britânico a propor a teoria da evolução
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Como o bicentenário do nascimento de Darwin é nesta quinta-feira dia 12 de fevereiro (2009), nada mais adequado do que voltarmos a escrever sobre a sua obra e seu legado.

Acaba de sair aqui nos EUA um livro oferecendo um ponto de vista bem diferente sobre a motivação principal que levou Darwin a desenvolver a teoria da evolução.

Em “A Missão Sagrada de Darwin” (“Darwin’s Secret Cause”), Adrian Desmond e James Moore argumentam que foi a repugnância moral de Darwin à escravidão que o motivou a levar adiante suas ideias.

E foi quando Darwin visitou o Brasil durante a famosa viagem em torno do mundo com o navio HMS Beagle que ele travou contato direto com os horrores da escravidão.
Certo dia, quando passava de canoa por um mangue, Darwin ouviu um grito terrível. O doloroso episódio ficou gravado na sua memória.

“Até hoje”, escreveu o naturalista em seu jornal mais tarde, “quando ouço um grito à distância, revivo com enorme intensidade o que senti quando, ao passar perto de uma casa em Pernambuco, ouvi gemidos terríveis, certamente vindos de um escravo sendo torturado e, tal qual uma criança, não pude fazer nada.”

Em seus livros “A Origem das Espécies” e “A Origem do Homem e a Seleção Natural”, Darwin argumenta por uma origem comum da vida. Sendo assim, existe uma irmandade entre todos os homens, o que torna a escravidão um crime absurdo. O interessante do argumento é que, segundo os autores, foram as ideias abolicionistas de Darwin que o levaram à teoria da evolução e não o contrário.

Seu avô, o famoso médico e poeta Erasmus Darwin, era um notório abolicionista, muito amigo do industrial Josiah Wedgwood, cujas porcelanas são conhecidas até hoje. Wedgwood usou seus fornos para criar um medalhão com a imagem de um escravo acorrentado e a legenda: “Não sou também um Homem e seu Irmão?” O medalhão era um objeto cobiçado por todos que eram da mesma opinião.

As famílias Darwin e Wedgwood foram unidas por uma série de matrimônios. O próprio Charles casou-se com Emma Wedgwood, sua prima de primeiro grau. (Interessante que o pai da evolução tivesse feito isso. Tiveram dez filhos e dois morreram na infância. A cada vez que um dos filhos ficava doente, Darwin se preocupava com os laços excessivamente estreitos de sua família. Nesse caso, ter dez filhos deve ter sido provavelmente uma espécie de experimento.)

A abolição era certamente tema constante nas conversas da família, um trato quase hereditário. Foi nesse ambiente ideológico que Darwin cresceu e criou os filhos. Certamente, Darwin viu escravos ainda na Inglaterra. Ao estudar (teologia) em Cambridge, aprendeu que certos membros da igreja anglicana eram radicalmente contra a escravidão. Sabia que não estava sozinho e que o movimento abolicionista apenas cresceria com o tempo. Mas queria mais do que argumentos apenas morais. Queria argumentos científicos.

Ao propor a evolução das espécies, Darwin não nos excluiu. Esse foi o maior motivo para a recepção nem sempre positiva de suas ideias. “O quê? Nós, descendentes de orangotangos? Primos dos negros da África, dos chineses e dos aborígenes da Austrália? Ridículo!”

Para Darwin, não havia dúvidas. A vida bifurcava a partir de um tronco único. O fato de sabermos hoje que nossa constituição genética é extremamente próxima da dos chimpanzés (entre 95% e 98,7%) só fortalece o seu argumento. Se a ciência de Darwin não foi criada para justificar a unidade da vida, ela certamente o fez.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”.
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Planeta Terra

O dia em que a Terra parou

Marcelo Gleiser

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Obama chamou gente de primeira para a área ambiental
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Semana passada, assisti à nova versão do clássico filme de ficção científica “O dia em que a Terra parou”. O original, de 1951, dirigido por Robert Wise, tinha uma missão sombria: alertar a população para os perigos da Guerra Fria e uma possível catástrofe nuclear. Um ser extraterrestre, Klaatu, e seu super-robô Gort, vêm à Terra para interceder junto aos líderes mundiais.

Caso falhem, e a humanidade constitua uma ameaça à galáxia, uma liga interplanetária destruiria a Terra e os seus primitivos habitantes que não sabem viver sem violência. “Viemos visitá-los em paz e com boa vontade”, diz Klaatu ao sair da espaçonave. Logo leva um tiro de um soldado. Não temos a sofisticação moral para lidar com seres superiores e aprender com eles. O que tememos, destruímos. Do ponto de vista do alienígena, somos macacos com brinquedos perigosos.

Passados 57 anos, pouco mudou.

Continuamos sendo moralmente primitivos e com armas cada vez mais poderosas. Vivemos permanentemente à beira de uma catástrofe nuclear. Mudaram os focos da crise, mas a realidade não. Os EUA e a Rússia mantêm um estoque de milhares de bombas nucleares. O desequilíbrio no Oriente Médio e a crise econômica na Rússia e na Ucrânia podem abrir caminho para que materiais e segredos nucleares caiam nas mãos de terroristas. Mesmo a simples contaminação dos aqüíferos com material radioativo pode afetar milhões de pessoas.

Mas o novo Klaatu não veio aqui para falar de bombas atômicas. Sua missão é outra. Keanu Reeves, um alienígena perfeito (aliás, só mesmo em papéis como esse ou como Neo em “Matrix” ele tem a chance de mostrar o seu talento de não-ator), e seu robô Gort -um monstro ultra-avançado criado a partir de nanorobôs e materiais desconhecidos na Terra- vem aqui para salvar o mundo. Nosso planeta está sendo destruído, diz ele. E os culpados são os humanos. Caso sua missão falhe -e falha logo de saída, como na versão original-, a humanidade será aniquilada para proteger a Terra. Somos uma espécie predadora e destrutiva. Não compreendemos a repercussão global do que fazemos com o nosso planeta. Somos primitivos, moralmente e ecologicamente. Não merecemos viver no planeta em que vivemos, “um dos poucos na galáxia capazes de sustentar a vida com tanta diversidade”, diz Klaatu.

Não sabemos quantos planetas na galáxia têm as propriedades da Terra e a capacidade de manter a vida por bilhões de anos. Mas tudo indica que são poucos.

A missão de Klaatu é a nossa missão, a missão da nossa geração: salvar o planeta de nós mesmos. A questão não se reduz apenas ao aquecimento global, se bem que essa já deveria ser suficiente para produzir profundas mudanças na política de meio ambiente. Temos que incluir a devastação das florestas, o desrespeito aos animais e à vida em geral, a agricultura sem planejamento que devora os nutrientes dos solos, a exploração cega dos combustíveis fósseis que causa devastações ecológicas de proporções apocalípticas.

No estado da Virgínia do Oeste, nos EUA, montanhas inteiras são destruídas na produção do carvão mineral, enquanto os detritos são atirados nos vales e rios. Exemplos como esse não faltam mundo afora. O planeta sofre como um todo.

Felizmente, parece que as coisas estão mudando. Na mesma semana em que o filme foi lançado, Barack Obama anunciou os membros do seu gabinete de energia e proteção ambiental. Gente de primeira, competentes e plenamente cientes daquilo que precisa ser feito. Espero que Klaatu, que sem dúvida estava já por chegar, fique em órbita um tempo, observando. Talvez ele não precise aterrissar.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”


Fonte:
JFSP21DEZ08MAIS3
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Extraterrestres/Marcelo Gleiser

Explicando…

Amigo visitante,
O quadro acima é uma “Análise Gráfica” do texto original do prof. Marcelo Gleiser que eu publiquei aqui no blog sob o título “Sobre a origem da Vida”.

Observe a beleza deste gráfico.
Quanto maior o tamnho da fonte do caracter, maior a incidência da palavra no texto original, assim caracterizando o “foco” que o autor aplicou.

O programa gerador deste gráfico pode ser visto e utilizado por qualquer pessoa no site – www.many-eyes.com – A autora do software é a dra. Fernanda Viégas, brasileira, do MIT.

O processamento do texto submetido é feito pela IBM.

As informações relativas ao site eu as obtive no Jornal Folha de São Paulo, datado de 29out08, Caderno de Informática, na página F4.

Ficarei muito agradecido se você se manifestar, dando seu parecer.
Muito grato,
Fraternalmente,
Leal
ep-leal@uol.com.br
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Sobre a origem da Vida

Sobre a origem da vida

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Mesmo se existirem, os extraterrestres devem ser raros
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+ Marcelo Gleiser

Dos grandes mistérios que despertam enorme interesse tanto de especialistas quanto do público em geral, poucos são tão fascinantes quanto a questão da origem da vida. Existem várias facetas diferentes, cada uma com seu conjunto de questões em aberto. Uma das mais óbvias diz respeito à possível existência de vida extraterrestre. Se existe vida na Terra, por que não supor que ela exista também em outros planetas?

Essa pergunta em geral é respondida com outra pergunta. Do que a vida precisa para existir? Se usarmos a Terra como base -e só conhecemos a vida aqui-, consideramos que são essenciais a água líquida, certos compostos químicos e calor ou alguma outra fonte de energia. Água líquida impõe que o planeta não esteja muito distante ou muito perto de sua estrela.
Caso contrário, teria apenas água congelada ou vapor. A água líquida cria o meio onde as reações químicas que sustentam a vida podem ocorrer. Não é à toa que somos mais de 60% água.

Planetas que podem ter água líquida estão na chamada “zona habitável”, um cinturão cuja distância varia com o tipo de estrela. No caso do Sol, cobriria Vênus, Terra e Marte. Imediatamente, vemos que estar na zona habitável não é suficiente.

Vênus tem uma temperatura que vai além de 500C, por causa de um acentuado efeito estufa.

Marte, como foi descoberto recentemente, teve água líquida no passado, tem alguma hoje e também tem gelo, mas não foram encontrados rios, oceanos ou lagos. A possibilidade de vida lá hoje não é nula, mas é remota.

Aprendemos que composição e densidade da atmosfera e a história do planeta são determinantes. A vida precisa de certos elementos químicos. Carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio são essenciais. Fósforo, ferro, cálcio, potássio também são importantes. Esses elementos são sintetizados em estrelas durante seus últimos estágios de vida. Quando a estrela “morre”, explode com tremenda violência, emitindo esses e todos os outros elementos da tabela periódica pelo espaço interestelar.

Planetas capazes de desenvolver formas de vida precisam estar numa região com os ingredientes certos. Fora isso, os ingredientes precisam ser combinados corretamente. Pelo que vemos aqui, mesmo as formas mais primitivas de vida dependem de compostos orgânicos consistindo de cadeias muito longas de átomos de carbono ligados a uma série de radicais.

Os átomos de carbono são os ossos da espinha dorsal, dando suporte ao resto.

Como que esses átomos formaram cadeias tão complexas? Essa questão permanece em aberto. Mas em 1953, Stanley Miller fez uma grande descoberta: combinando substâncias que acreditava terem feito parte da atmosfera primitiva (metano, gás carbônico, água e outros), Miller isolou-as num frasco e passou faíscas elétricas que simulavam raios.

Para sua surpresa, ao examinar os compostos acumulados no fundo do frasco, percebeu que tinha sintetizado alguns aminoácidos, componentes fundamentais das proteínas. Miller não produziu a vida no laboratório, mas demonstrou que processos naturais podem tornar uma química simples numa química complexa.

Assim como o experimento de Miller, a vida precisa de uma fonte de energia. Aqui, estamos acostumados com o Sol.

Mas a descoberta de formas de vida que vivem na mais completa escuridão, em fossas submarinas profundas, demonstra que processos químicos independentes da luz podem gerar a energia capaz de impulsionar os mecanismos da vida. Não basta afirmar que o vasto número de planetas no cosmo torna a vida extraterrestre inevitável. O que aprendemos é que, mesmo se existir, será rara.

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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2610200803.htm

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Outra visão:
http://www.freewebs.com/ovniseets/
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Sobre a criatividade

Sobre a criatividade
+Marcelo Gleiser

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Como bom carioca, “sacada” é a boa tradução para “insight”
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Na semana passada, escrevi sobre o riso. Como vimos, não existe uma teoria aceita que explique a relação entre o estímulo mental causado pela piada e sua transformação na reação física igual em todas as partes. Todo mundo ri da mesma forma, mesmo que seja de piadas diferentes. Dentre as teorias populares, a de Kant é bem razoável, especialmente casada com a de Freud.

Kant disse que rimos quando existe uma interrupção inesperada na lógica da história, uma contradição na expectativa do desenlace. Sem surpresa não rimos. Freud disse que a reação física vem da liberação de impulsos que os superegos reprimem. No universo da piada, podemos “deixar cair”.

Existe uma outra dimensão do riso causado pelo humor que gostaria de abordar: sua relação com a criatividade. A palavra inglesa “insight” não tem uma boa tradução em português. Segundo o venerado dicionário Michaelis, “insight” significa “introspecção, compreensão, discernimento, critério”. Talvez “compreensão” se aproxime do significado, mas ainda não lhe faz jus. Como bom carioca, “sacada” me parece funcionar melhor, especialmente adicionada de “genial”.

O ponto interessante é a conexão entre humor e “insight”, o momento do “ahá!”, da compreensão inconsciente de algo. Toda piada, quando explicada, perde a graça. A reação física característica do riso, o alívio de uma tensão mental, só se manifesta quando “entendemos” a piada de forma não-racional ou consciente. A compreensão ocorre em algum lugar do cérebro que parece funcionar por si. Se o interrompemos com explicações, a reação da descoberta é perdida.

Assim é com os momentos criativos nas artes e nas ciências. Existe uma preocupação com a obra, um objetivo a ser atingido que permanece arredio. Esse é o análogo da tensão na piada, do encadeamento lógico da história da qual não conhecemos o fim. Não conseguimos provar o teorema, resolver a questão, encontrar a nota certa na composição musical ou o traço certo no quadro. Mas nossos cérebros continuam a funcionar, a buscar conexões na memória, correlacionando fatos e possibilidades. De repente, quando menos esperamos, a solução vem à tona explosivamente, o momento do “ahá!”, da sacada.

Esse momento é sempre acompanhado de uma sensação física de liberação, de um alívio que pode até mesmo levar a um estado de êxtase. Deve ser causado por uma corrente turbulenta de reações químicas regadas a muita endorfina. Imagino os neurônios piscando como loucos, transformando o cérebro numa espécie de árvore de Natal. O grego Arquimedes (diz a lenda) saiu correndo nu pelas ruas de Siracusa ao encontrar a solução para um problema que o afligia, um modo de provar que a coroa de seu rei, que deveria ter sido feita de ouro puro, foi na verdade feita de uma mistura de ouro e prata: a densidade determina se algo bóia ou não.

Mas como estudar quantitativamente o momento da sacada? Experimentos nos EUA e na Inglaterra vêm tentando fazer isso. Para tal, usam voluntários com chapéus cobertos de eletrodos capazes de medir as mudanças de corrente elétrica no cérebro quando tentam resolver problemas envolvendo palavras.

Vêem que, quando as pessoas estão num impasse, a atividade cerebral se limita à áreas associadas com o foco seletivo. Segundos antes de a solução chegar, o padrão muda e a atividade migra para a região frontal à direita, implicada na organização do conhecimento e na arquitetura de planos. Porém, os estudos estão longe de serem conclusivos. Falta uma sacada genial para entender o mecanismo mental que leva a ela.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1708200805.htm
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A vida vista de longe

A vida vista de longe

Os cientistas da Terra é que devem ir em busca dos ETs

“A vida busca a vida”, escreveu o celebrado astrônomo e divulgador de ciência Carl Sagan. Sendo assim, é no mínimo curioso que ainda não tenhamos recebido visitas de extraterrestres.

Afinal, mesmo se nos limitarmos à nossa galáxia, a ilha de cerca de 300 bilhões de estrelas da qual o Sol e os seus planetas fazem parte, há estrelas e planetas demais para que nenhum tenha desenvolvido vida, incluindo a mais rara vida inteligente. Esse é o famoso paradoxo de Fermi: dado o número de estrelas da Via Láctea e os seus 10 bilhões de anos (o dobro da idade do Sol), os ETs teriam tido tempo de sobra para desenvolver tecnologias capazes de cruzar as enormes distâncias interestelares e vir nos visitar. E a verdade é que, tirando as hipóteses absurdas de Erich von Däniken, segundo a qual ETs estiveram já por aqui e ajudaram a construir as pirâmides egípcias, as linhas de Nazca e outros projetos grandiosos de nossos antepassados (e descontando os relatos de indivíduos sem maior prova do que narrativas ou fotos suspeitas), os ETs nunca estiveram por aqui. Se estiveram, não parecem estar interessados em contatar cientistas ou políticos para um papo mais sério, limitando-se a exibir suas espaçonaves nas noites e a realizar experimentos com o aparelho reprodutor humano.

Dada esta crua realidade, são os cientistas da Terra que devem ir em busca dos ETs. O problema que enfrentamos são as enormes distâncias. Infelizmente, o espaço entre as estrelas é muito grande e essencialmente vazio. Temos procurado por vida na nossa vizinhança, nos planetas e nas luas do Sistema Solar. Mas, até agora, não encontramos nada, e é pouco provável que encontremos mesmo uma mísera bactéria no subsolo marciano, ou no oceano sob a espessa camada de gelo que cobre Europa, uma das luas de Júpiter. A vida, mesmo não sendo exclusividade do nosso planeta, é rara.

Tomemos como exemplo nossa estrela vizinha, a Alfa-Centauro. Em números arredondados, ela fica a 5 anos-luz do Sol: a luz demora cinco anos de lá até aqui. Isso equivale a uma distância aproximada de 50 trilhões de quilômetros (5 x 1013km). Com tecnologias atuais, em que espaçonaves atingem velocidades de cerca de 50 mil km/h, demoraríamos em torno de 115 mil anos para chegar lá… Obviamente não será esse o caminho para descobrirmos se existe vida fora da Terra. Seria realmente fascinante se inteligências extraterrestres tivessem desenvolvido tecnologias capazes de cobrir essas distâncias com mais eficiência. Por que eles não vêm aqui nos explicar como se faz?

O jeito é procurarmos por vida remotamente. ETs que tivessem telescópios dotados com espectrógrafos poderiam analisar a composição química da atmosfera terrestre. Veriam a enorme quantidade de oxigênio e água; veriam ozônio, metano, óxido nitroso, e concluiriam que aqui existem ciclos de conversão de energia solar em metabolismo típico de seres vivos. Oxigênio, em particular, é um excelente sinal de vida. Em geral, quando presente, é rapidamente usado na oxidação de rochas. Livre, como por aqui, é prova de que algo o está produzindo com muita eficiência. Algo vivo.

Vários projetos futuros farão o mesmo; procurarão por vida na atmosfera de planetas girando em torno de outras estrelas. A vida, se existir, dependerá da estrela que lhe provê energia; estrelas mais fracas do que o Sol poderão ter plantas pretas, para fixar mais energia; nas mais fortes, as plantas terão de refletir parte da luz; nas estrelas que emitem muito ultravioleta, a vida terá que ser embaixo d’água para se proteger da radiação. Se vida busca vida, parece que somos nós que teremos que encontrá-la.

MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro “A Harmonia do Mundo”
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Fonte: JFSP13JUL08mais!9
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1307200804.htm
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Música das Esferas

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Música das Esferas

Marcelo Gleiser

O curso vai explorar a relação entre a harmonia e o cosmo. Começando com os conceitos dos filósofos da Grécia Antiga, Gleiser investiga como as noções de beleza, música e geometria serviram e servem de inspiração para algumas das idéias mais fascinantes sobre o universo onde vivemos. Os temas a serem abordados incluem: a filsosofia de Pitágoras, Platão e Aristóteles; o cosmo medieval cristão; a Renascença e Copérnico, Kepler e Galileu; Einstein, a teoria da relatividade; o átomo e a revolução quântica.

Marcelo Gleiser
O físico Marcelo Gleiser é doutor pelo King´s College da Inglaterra e fez parte da equipe de pesquisadores do Fermilab, de Chicago e do Institute for Theoretical Physics, da Califórnia. Atualmente é Appleton Professor of Natural Philosophy e professor de Física Teórica e Astronomia da Faculdade de Dartmouth, em Hanover, Estados Unidos. É bolsista da National Science Foundation da Nasa e da Otan. Em 94 recebeu o prêmio Presidential Faculty Fellows Award, das mãos do então presidente americano, Bill Clinton. É autor de mais de 70 artigos em física teórica e dos livros A dança do universo, Retalhos cósmicos e A Harmonia do Mundo.

Dia 12 de maio| sábado | das 14h às 17h
Livraria Cultura do Shopping Villa-Lobos – Av. das Nações Unidas, 4.777 – Tel. (11) 3491 0529
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Fonte:
http://www.universodoconhecimento.com.br/
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54 Solidão Cósmica

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Solidão Cósmica

Autor: Marcelo Gleiser

De 1 milhão de mundos com vida, uma pequena fração terá vida multicelular

Nos últimos 15 anos, astrônomos confirmaram algo que muitos cientistas e, antes deles, filósofos, suspeitavam: o Sol não é a única estrela que tem planetas girando à sua volta. Os planetas nascem juntamente com as estrelas, como conseqüência da implosão gravitacional de nuvens ricas em hidrogênio, hélio, oxigênio e muitos outros elementos. Ou seja, nosso Sistema Solar não é especial, ao menos no que tange ao fato de ter planetas e luas em órbita de uma estrela central.

Vamos então supor que, em média, as estrelas tenham ao redor de si em torno de cinco planetas e um número indefinido de luas. Claro, algumas vão ter mais planetas, outras menos -ou até nenhum planeta. Mas a suposição é razoável dentro do que sabemos hoje. Como existem em torno de 200 bilhões de estrelas na nossa galáxia, a Via Láctea, nossa suposição implica que cerca de um trilhão de planetas, um trilhão de mundos, circulem pela nossa “vizinhança” cósmica. As aspas são um lembrete de que por vizinhança quero dizer apenas a nossa galáxia, com um diâmetro de 100 mil anos-luz.

Uma vizinhança aparentemente grande mas ínfima na escala cósmica, onde existem algumas centenas de bilhões de galáxias, cada qual com seus milhões ou bilhões de estrelas. Desse trilhão de planetas em nossa galáxia, talvez 1% esteja localizado na “zona habitável”, o cinturão que define a distância entre planetas e estrela na qual é possível que exista água líquida: muito perto da estrela o calor evapora a água; muito longe, o frio a congela. No Sistema Solar, a Terra é o único planeta na zona habitável. Mas veja que mesmo essa regra é apenas relativamente útil: Europa, uma das luas de Júpiter -portanto, fora da zona habitável-, tem um oceano de água salgada sob uma crosta de gelo que cobre toda a sua superfície, como um bombom com licor dentro, duro por fora e líquido por dentro.

Desse 1% de planetas com água líquida, em torno de 10 bilhões em nossa galáxia, quantos podem ter desenvolvido vida? Ninguém sabe ao certo. Porém, o que vemos aqui na Terra é que a vida é extremamente criativa e resistente: bactérias foram encontradas sob o gelo das calotas polares, ao redor de chaminés submarinas onde a água ferve e não existe luz ou oxigênio, e até mesmo em piscinas usadas para resfriar reatores nucleares. Dado que as mesmas leis da química e da física valem em todo o cosmo, não é absurdo supor, e, de fato, não vejo como pode ser diferente, que as leis da bioquímica e da biologia também valham em todo o Universo.

Conseqüentemente, é muito provável que formas de vida primitiva tenham aparecido em outros mundos com água líquida.
Digamos que 0,01% dos mundos com água líquida tenham vida, um em cada 10 mil. Ficamos com 1 milhão de mundos na Via Láctea com alguma forma de vida primitiva. Quantos desses mundos desenvolvem seres multicelulares? Mais uma vez, ninguém sabe. Aqui na Terra, a vida permaneceu unicelular por quase 2 bilhões de anos. O pulo para seres multicelulares é difícil. Para seres complexos, como répteis ou mamíferos, maior ainda.

Portanto, desse 1 milhão de mundos com vida, uma pequena fração terá vida multicelular. Qual? Ninguém sabe. Digamos 0,01%, o que nos deixa com cem mundos. Deles, talvez alguns tenham vida inteligente, um punhado deles. Ou talvez apenas um, o nosso. Difícil aceitar essa solidão cósmica. Mas pelo que sabemos hoje, ela parece ser inevitável. O que nos torna raros e preciosos.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro “A Harmonia do Mundo”
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Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2503200701.htm
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